A versão original em espanhol desta aventura foi publicada em 7 de Outubro de 2008 com o título "Han Cazado A La Pantera"
CAÇA À PANTERA
Por Lou Carrigan
Tradução: Anderson M. Capitão
- Você é a Montfort, certo?
Brigitte Montfort, que acabara de sair do
edifício do “Morning News”, o diário matutino novaiorquino no qual exercia a
função de diretora há alguns anos, permaneceu olhando de maneira amável o
sujeito que havia feito a pergunta de modo tão rude e até mesmo grosseiro. Era
alto, robusto, com uma cabeça grande e redonda totalmente raspada e, deixando
de lado seus modos de cafetão, estava claro que era uma pessoa que se cuidava,
pois o olhar experiente de Brigitte percebeu imediatamente o contorno de uma
arma na sua axila esquerda, sob o barato casaco.
- Sim, isso mesmo. - respondeu sempre amigável. -
Sou a senhorita Montfort.
- Ora, ora. Senhorita, né? Entendo. Bem, quero
dizer, o importante é que é “a Montfort”. Ou não é?
Brigitte não se conteve e riu. Isso é que é
importante? Se tivesse explicado ao rude personagem tudo que é relacionado à
"Montfort", com certeza haveria de crescer cabelo de repente naquela
careca e, com mais certeza ainda, cabelos brancos devido ao susto.
- Sim, sim. - disse após a gargalhada. - Eu sou
a Montfort.
O homem parecia confuso, mas a fitava
ameaçadoramente.
- Bem, logo veremos se será tão engraçado ser a
Montfort. Você sabe o que é uma pistola?
- Santo Deus. - pensou Brigitte. - De onde vem
esse monstro imbecil?
- Sim, senhor. Eu sei o que é uma pistola.
- Excelente. Pois veja bem: eu uso uma e daquele
carro ali – apontou ao carro parado em fila dupla – dois colegas meus estão
apontando as suas bem disfarçadamente. E se você não entrar naquele carro bem
calmamente e até demonstrando um sorriso, eles vão descarregar seus pentes em
você. Será que fui claro?
- Acho que sim. – sorriu Brigitite. - Vocês querem
me sequestrar, então?
- Você é muito inteligente, madame. Venha,
caminhe até o carro. E tenha muito cuidado com o que faz. Você deve se
comportar como se fôssemos velhos e bons amigos.
Brigitte ergueu as sobrancelhas, ainda
divertindo-se. Do edifício do “Morning News” saiam e entravam muitas pessoas, e
todas elas a conheciam bem e há bastante tempo. Mesmo assim, muitas delas se
surpreenderiam se de repente lhes dissessem que a belíssima, amável e elegante
Brigitte Montfort era nem mais nem menos que a inesquecível agente “Baby”, capaz
de detonar sozinha vinte cretinos como o que tinha diante de si, sem pestanejar.
Mas seria mais surpreendente ainda se lhes dissessem que a senhorita Montfort
era amiga daquele sujeito ou apenas que tivesse alguma coisa a ver com ele. Seria
como deparar-se com uma rosa e com o esterco juntos, mas nunca achariam que
vieram do mesmo jardim.
- Farei como me instruir. – aceitou Brigitte. -
Vamos ao carro. Qual é o seu nome, amigo?
- Carson. E é só isso que deve saber.
- Tudo bem.
Ambos caminharam em direção ao carro. Algumas
pessoas cumprimentaram Brigitte deixando transparecer certa estranheza. Ela
respondia aos cumprimentos como se nada de anormal estivesse acontecendo e
assim chegaram ao carro. Carson abriu a porta traseira direita e Brigitte
entrou no veículo. O homem que estava sentado naquele lugar, junto à janela e
com uma pistola escondida, afastou-se para o outro extremo do assento.
Carson sentou-se ao lado do motorista e disse:
- Vamos embora. A pomba está na gaiola.
Brigitte teve que fazer um grande esforço para
não rir novamente. Se uma vez ela já havia sido confundida com uma gaivota,
poderiam também confundi-la com uma pomba. Mas, certamente, ela não era nem uma
ave nem outra. Claro que se se tratasse de paz, aí sim poderiam chamá-la de pomba
da paz. Mas a precisa e altamente desenvolvida intuição de Brigitte lhe dizia
que, mais uma vez, havia encontrado pessoas que não estavam exatamente em favor
da paz, fato que não a alterou em absoluto. Há muito tempo ela havia aprendido
que se ela não encontrasse os conflitos, os conflitos a encontrariam.
O carro arrancou misturando-se ao trânsito e ao
caos de circulação do pico da tarde na ampla avenida novaiorquina. O homem
sentado à esquerda de Brigitte disse:
- Você não parece assustada.
- Por que deveria estar? – ela olhou calmamente
para ele. Se quisessem me fazer mal, poderiam simplesmente ter atirado minutos
atrás sem que Carson tivesse que se preocupar em conversar comigo de modo tão
simpático. Obviamente, trata-se de um vulgar sequestro, ou seja, de dinheiro,
certo? Então podemos todos nos manter calmos, pois certamente chegaremos a um
acordo.
O motorista a observava pelo retrovisor interno.
Carson, por sua vez, virou-se no assento para vê-la. O terceiro homem, ao seu
lado, também a olhava; e os três o faziam de modo especial.
Naturalmente, a senhorita Montfort não precisaria
de muito tutano para saber, sem sombra de dúvida, que não se tratava de um
sequestro comum, mas de algo muito mais perigoso para ela. Ela também sabia (e
isso a preocupava um pouco) que eles não tinham a intenção de matá-a, pelo
menos a curto prazo. Isso certamente já poderiam tê-lo feito com toda
tranquilidade em vez de aparecer próximo a ela em plena rua movimentada. Poderiam
ser mais discretos e fazê-lo mais simples, se fosse o caso. Certamente sabiam
que morava no “Crystal Building”, na Quinta Avenida, de frente para o Central
Park; sabiam que ocupava um apartamento grande e luxuoso no vigésimo sétimo
andar do qual se podia contemplar toda a extensão do parque; e sabiam que tinha
três vagas na garagem do sub-solo do edifício: só teriam que esquivar-se da
rotineira vigilância dos funcionários do prédio, descer até o estacionamento,
esperar o momento em que ela chegasse com seu carro ou que se dispusesse a sair
da garagem, e praticamente sós, matá-la sem quaisquer complicações.
Portanto, se era possível fazê-lo assim, tão
discreta e comodamente, por quê transformariam seu sequestro num espetáculo
público no coração de Nova York?
Ainda que... Não, a intenção não era a de fazer
parecer um sequestro sob os olhos de testemunhas, mas sim um encontro de amigos
como ficou clara a pretensão de Carson e seus comparsas.
Por mais surpreendente e intrigante que fosse, não
era isso que assustaria Brigitte Montfort. Durante toda sua vida, havia passado
por riscos muito piores do que o atual. Embora nunca se sabe...
Circulavam com a característica lentidão do
final de expediente em Manhattan, horário de pico da tarde. Assim que iniciaram
a travessia da ponte do Brooklyn, Brigitte gemeu e inclinou-se na porta
parecendo que iria desmaiar.
- Por
favor. - ela gemeu. - Por favor, pare o carro!
Carson virou-se para ela.
- O que você tem? - gritou alarmado.
Brigitte colocou a mão na testa e fechou os
olhos.
- Não estou me sentindo bem. - murmurou com voz
embargada. - Estou... estou um pouco enjoada... Eu acho... acho que vou...
- Ei, ei, nada disso! - gritou o motorista. -
Não se atreva a vomitar neste carro! Aguente que eu vou parar assim que tiver
uma chance.
Nem sequer levou dez segundos para parar, em
plena ponte e exposto a todos os riscos associados. Os três homens olhavam com
ares entre irritados e assustados para Brigitte, que estava com os olhos
fechados e a boca aberta num gesto de angústia.
- Já estamos parados. - resmungou Carson. – E
agora?
Ela mal abriu os olhos e murmurou:
- Sempre... sempre tenho na minha bolsa alguns
comprimidos de enjoo. Acontece com alguma frequência, então costumo andar
prevenida.
Ela começou a abrir a bolsa, mas Carson mostrou
sua arma e disse:
- Cuidado com o que vai tirar dessa bolsa.
- Oh, por Deus! - protestou Brigitte com o tom
de quem ouviu uma enorme tolice.
Ainda assim, Carson pegou a bolsa, revirou seu
conteúdo bastante desconfiado, resmungou alguma coisa e a devolveu. Brigitte
procurou e rapidamente retirou da bolsa uma cápsula que mostrou a Carson. Ele assentiu
e Brigitte imediatamente a ingeriu, apoiou a cabeça no encosto do assento e
fechou os olhos.
Carson parecia intrigado. Era certo que "a
Montfort" já tinha passado dos sessenta, mas ela estava longe de aparentar
uma idosa, pois seu aspecto era magnífico, saudável. Não parecia daquelas senhoras
que são capazes de desmaiar se alguém disser uma inconveniência ou cuspir na
rua. Sim, Carson começou a se dar conta de que "a Montfort" era uma
mulher especial. Não era exagero, é claro que ela não aparentava ser uma
jovenzinha, mas havia algo... alguma coisa... sim, especial. Por um momento Carson
a imaginou nua e quase estremeceu por causa dos desejos e impulsos que essa
visão lhe provocou. Olhou para seus companheiros que também observavam Brigitte
com grande interesse, e houve uma troca de olhares entre os três homens que não
poderia expressar de forma mais clara a admiração masculina por aquela senhora
de cabelos negros suavemente ondulados e enobrecidos pelos poucos cabelos
brancos que, a bem da verdade, embelezou o rosto encantador de grandes, esplêndidos
e brilhantes olhos azuis.
- Olha... - murmurou o motorista. - Não podemos
passar mais tempo aqui, senhora, ou outros motoristas vão acabar nos matando.
Ela suspirou, apertou as pálpebras e disse:
- Sim, obrigada. Já estou me sentindo melhor. É que
o remédio leva um tempo para fazer efeito, mas, por favor, siga em frente. E desculpe-me.
- Não se preocupe. - sorriu Hewitt repentinamente.
- Olha, você é linda, sabia?
- Sim, eu sei. - riu Brigitte. Muito obrigado
por dizê-lo, de toda maneira.
A viagem não foi muito longa e durante o trajeto
Brigitte pode inteirar-se de que seu vizinho de assento chamava-se Sparck e o
motorista Hewitt. Quando chegaram ao destino já era praticamente noite e
Brigitte sabia que havia cruzado a divisa do estado de Nova York e que
encontrava-se em Rhode Island. A distância percorrida ultrapassou cem
quilômetros, que não era absurda; mas tampouco pareceu um passeio de prazer pelo
labirinto de estradas que existe naquela região.
Por fim, o carro parou num grande espaço de
estacionamento ao lado de um grande edifício com três andares e muitas
janelas, a maioria delas já iluminadas.
Brigitte notou imediatamente que ali era um laboratório.
- Fim da linha. – disse Carson espirituosamente.
- Todos para fora.
- Onde estamos? - perguntou Brigitte.
- Você já saberá. – disse Sparck. – Venha, saia
do carro. Estão nos esperando.
Saltaram os quatro e caminharam em direção à
entrada daquilo que não era propriamente uma clínica, ou pelo menos não era
apenas uma clínica. No topo da ampla porta de vidros grossos, havia a seguinte
inscrição pintada com tinta esmalte preta:
C I C
Centro de Investigações Científicas
Brigitte olhou de forma intrigada a Carson, mas ele
limitou-se a dar de ombros e apontar para o interior iluminado. Entraram em uma
sala onde uma garota muito bonita, que estava atrás do balcão de recepção
vestida com um avental branco, olhou para eles com pouco interesse. Não havia
mais ninguém no lobby. Carson fez um sinal com a cabeça em direção a um
corredor localizado à esquerda do lobby, a menina concordou e Carson caminhou
naquela direção, seguido pelos demais. Pouquíssimo tempo depois, Brigitte e
seus raptores entraram numa sala espaçosa, luxuosamente decorada, em que era
evidente sua utilização como um escritório, a julgar pelo mobiliário e pelos computadores.
Haviam quatro mulheres sentadas nas poltronas que
ficavam no centro do escritório, de frente a um grande sofá, também luxuoso. Um
avental branco cobria suas roupas particulares, mas sua beleza e elegância não
se podiam esconder. As quatro olharam para Brigitte com um gesto de certa
curiosidade e, em seguida, uma delas voltou-se para Carson.
- Algum problema? - perguntou.
- Não. É uma pessoa bastante razoável que logo
percebeu que seria melhor colaborar.
- Vocês levaram mais tempo que o esperado.
Ela se atrasou um pouco em comparação ao horário
de costume. De qualquer forma, assim que saiu do jornal, Crowen, que estava de
campana no mesmo andar, nos avisou pelo celular que ela havia entrado no
elevador. Eu, então, pedi a Hewitt e Sparck, que estavam esperando no carro num
estacionamento próximo, que se aproximassem e viessem nos pegar. Ela demorou,
ainda, um minuto para sair do prédio, mas pudemos manter o carro parado em fila
dupla sem maiores complicações. E como disse antes, ela rapidamente se adaptou
à situação e não criou qualquer problema. É uma mulher inteligente e simpática.
- É precisamente disso que se trata. – disse a
mulher sorrindo. – Me parece que vocês não sabem muito bem com quem estiveram
passeando de carro.
- E vocês? Será que sabem? - perguntou Brigitte.
- Por favor, senhorita Montfort! Claro que nós
sabemos! Poderíamos dizer que você é a mulher mais importante dos Estados
Unidos da América e uma das mais importantes do mundo.
- Bem, estes três cavalheiros não parecem estar
cientes disso. – sorriu a divina.
- Pertencem a uma esfera social um tanto
peculiar e por essa razão foram escolhidos para esta, digamos, ocorrência.
- E qual é a ocorrência? O que vocês estão
planejando?
As quatro sorriram ao mesmo tempo. A porta-voz
do grupo fez um sinal a Carson e seus companheiros, e os três silenciosamente deixaram
o escritório. Brigitte observava cada uma das mulheres, com uma preferência àquela
que parecia ser a porta-voz do grupo. Quatro mulheres bonitas, aparentando serem
cientistas ou, pelo menos, pertencentes à profissão médica. Duas loiras, uma
morena e uma ruiva. As quatro pareciam ter por volta de quarenta anos, mas conservavam
um ar juvenil; uma aparência atraente, de fato real; e uma postura até certo
ponto arrogante.
- Digamos que se trata de um assunto em que o
seu jornal se intromete com bastante regularidade e insistência.
- Se você se refere ao “Morning News", -
disse Brigitte, - o jornal não é meu. Sou apenas a...
- Ah, sim! - interferiu outra das mulheres. - Bem,
vamos considerar que é praticamente seu. Sabemos que o “Morning News” é uma empresa
formada por acionistas como tantas outras. E adivinha quem tem sido, já faz
tempo, o principal acionista do jornal e, portanto, seu proprietário de direito...
quero dizer, sua proprietária?
Brigitte voltou a revezar seu olhar entre cada
uma de suas belas interlocutoras. Era evidente que elas não sabiam apenas o que
sabem as pessoas bem informadas do mundo; ficou claro que haviam se
aprofundado, que a investigaram cuidadosamente. Mas, até que ponto? Será que
descobriram que a senhorita Montfort era a agente “Baby”, a mulher mais
perigosa do mundo? Não, claro que não. Se soubessem que ela era “Baby”, sua
atitude seria muito diferente. Então...
- Fui sequestrada por algo relacionado ao
“Morning”?
- Não! Não, não realmente. Digamos que o jornal
contribui bastante para melhorar sua personalidade pública, e é isso que nos
interessa: sua personalidade pública, ou seja, a grande imagem de prestígio e
credibilidade que é apreciada em Brigitte Montfort no mundo todo.
- Digamos... – interviu outra das belas mulheres
- ...você pode fazer o que quiser em qualquer lugar do mundo sem que ninguém sequer
pense em opor-se ou que desconfie de você.
- Sim. - sorriu a divina. - É verdade. E isso
pode ser de alguma utilidade a vocês?
- De muitíssima utilidade. Mas, por favor, sente-se
e acenda um cigarro se quiser.
- Há muitos anos deixei de fumar. E quanto a
sentar-me, se quisesse fazê-lo já o teria feito.
- Tem certeza que não quer sentar-se?
- Eu as vejo e estudo melhor permanecendo em pé.
- Ah! Está nos estudando? E a qual conclusão
está chegando nesse estudo?
- Que vocês são criminosas.
Pareceu que de repente a sala foi tomada por um
silêncio absoluto. As quatro olhavam fixa e inexpressivamente a Brigitte, com
feições rígidas e olhos imóveis, como congelados.
A porta-voz do grupo foi indicando cada uma de
suas companheiras, uma de cada vez, dizendo friamente:
- Elas são a Dra. Annabelle Simmons, a Dra.
Thelma Parsons e a Dra. Pamela Robinson. Eu sou a Dra. Susan Whitaker. Não
exercemos propriamente a medicina, mas todas temos o título que nos serve como
base para a nossa atual dedicação ao trabalho científico. Como é fácil de
perceber, não nos encaixamos na descrição que nos fez.
- E você tem uma língua muito longa e agressiva,
disse a Dra. Parsons.
- Perdoem minha grosseria. - sorriu Brigitte. - Às
vezes me escapam algumas inconveniências. Coisas da idade.
- Quer dizer, então, que você não acha que somos
criminosas?
- Ah, sim. – sorriu a divina. – Sobre isso não
tenho a menor dúvida. Mas eu deveria ter sido mais discreta e menos agressiva.
Não deveria irritar aqueles que, neste momento, estão numa posição vantajosa
sobre mim. Provocar criminosos pode ter consequências muito ruins.
- O que você pretende? Deixar-nos furiosas para
que a matemos imediatamente e evitar, assim, um período difícil?
- Poxa! Você não acha que morrer é ainda pior
que um período difícil? Prefiro, francamente, que me digam para que me
querem... viva.
- Você vai saber assim que... - começou Thelma
Parsons.
- Não, espera! – interrompeu Susan Whitaker. - Vamos
contar. Isso é o que ela quer, é claro, e por isso está nos provocando. A
verdade é que você nos está surpreendendo, senhorita Montfort, pois não é tão
delicada e sensível como nos disse Carson. Você o enganou anteriormente ou está
nos enganando agora?
- O que você acha?
- Eu acho... – riu de repente a Dra. Parsons - ...que
realmente enganou ao pobre Carson. Mas, claro, entendemos perfeitamente que uma
mulher sem gênio e sem força não poderia dirigir um jornal da importância do “Morning
News” como você está fazendo. Gostaria de saber em que tema se intromete o seu
jornal regular e insistentemente?
- Sim.
- Quanto ao terrorismo. Percebe-se claramente
sua rejeição total e condenação do terrorismo. Especialmente nos seus próprios artigos
da Seção Internacional pode-se ver claramente que o terrorismo é a besta a se
combater e destruir.
- E vocês não concordam com isso?
- Não. Além disso, temos planos para converter o
terrorismo em uma arte.
Brigitte encarou muito rapidamente cada uma das
quatro doutoras. Em seguida, sorriu agradavelmente.
- Pelo menos... – disse ...é uma ideia original:
o terrorismo se tornar arte. Como acham que vão conseguir?
- Você verá. Nós...
- Vamos, Annabelle. – riu a Dra. Robinson - não
seja presunçosa. À senhorita Montfort devemos dizer a verdade já que ela será
parte do espetáculo.
- Você está certa. – admitiu a Dra. Simmons. - Mas
desde que Susan esteja bem disposta a dialogar...
- Vamos por partes. – disse Susan Whitaker. - A
primeira coisa a fazer é não nos envaidecer, como bem disse Pamela. Em outras
palavras, devemos dizer à senhorita Montfort que a idéia não é nossa.
- E de quem é? - perguntou Brigitte.
- De Yong Gao e de Gao Yong.
- Ah.
- Vejo que você não os conhece. – riu a Dra.
Whitaker.
- Não, não os conheço. Mas gostaria de conhecer.
- Não sei se você terá tempo para isso, querida.
Seus serviços serão usados com a maior brevidade. Não que isso dependa de Gao Yong
ou de Yong Gao. Não depende nem mesmo de nós. Dependerá dos resultados, da
eficiência e rapidez da equipe.
- Equipe?
- Você está cheia de rodeios, querida Thelma. -
disse Parsons - Se você realmente quer explicar o projeto à senhorita Montfort,
vá direto ao ponto. Embora não acho que seja uma boa idéia que ela saiba tanto.
- Por quê não? Em primeiro lugar, isso não a ajudaria
em nada. E em segundo, poderia ser que a senhorita Montfort, que certamente é
uma pessoa inteligente e, eu diria, ambiciosa...
- Ambiciosa? – interrompeu Brigitte. - Por quê
você acha que eu sou ambiciosa?
- Pelo fato de ter adquirido a maioria das ações
do “Morning News” e tornar-se praticamente a dona. Você gosta do poder e de
dinheiro, isso está claro.
Brigitte permaneceu olhando fixamente para Susan
Whitaker. O que foi que ela disse? Disse os motivos pelos quais ela havia
assumido a presidência do conselho de administração e adquirido a propriedade
prática do “Morning News”? Não. Não valia a pena. Não valia a pena esclarecer
às quatro criminosas que ela dirigia o jornal com mão de ferro e tinha
adquirido a maior parte das ações para evitar que o “Morning News” fosse
destruído pelos outros principais acionistas que queriam vender suas ações a
qualquer preço para um jornal rival que ficaria feliz em atendê-los em certas
exigências nada éticas; e que também acabariam por destruí-lo os diversos
diretores de seção que se engalfinharam numa luta interna pelo controle durante
a qual se esqueceram completamente do que significava a palavra jornalismo, uma
luta que só debilitava o “Morning” e o afastava de sua histórica linha de
honestidade e seriedade, pelo menos da história de honestidade e seriedade que
começou quando a jornalista, senhorita Montfort, se juntou ao jornal assim que
se formou na Universidade de Columbia,
em Nova Iorque.
Tampouco valeria a pena esclarecer que, com
relação a dinheiro, poderia conseguir a quantidade que quisesse num simples
estalar de dedos. E quanto a poder... Bem, começando com a L.O.U. (Love
Organization United) que ela havia criado junto com Número Um, e passando pela
CIA, pelo FBI, pelo Exército e pelo próprio governo dos EUA, ela poderia reunir
tanto poder que essas quatro cretinas que acreditavam ter caçado uma pomba
sequer poderiam entender.
Mas naquele momento, o que a senhorita Montfort desejava
era saber o que estavam tramando aquelas quatro criminosas e como elas achavam
que transformariam o terrorismo numa arte.
- Sim, é verdade! – disse hipocritamente. - Eu
sou louca por poder e dinheiro.
- Nesse caso... – refletiu a Dra. Whitaker - ...talvez
fosse conveniente modificar os planos com relação a você e ao invés de usá-la
como experiência no novo terrorismo deveríamos uni-la ao nosso grupo. Yong Gao
e Gao Yong já têm muitos grupos, mas nunca é demais atrairmos quem pode trazer
dinheiro e poder.
- Isso é o que eu chamo pensar de forma sensata.
- elogiou Brigitte. – Mas, vejamos: do que se trata realmente tudo isso?
– De atualizar o terrorismo.
- Atualizar o terrorismo. - repetiu Brigitte tem
um sussurro tentando entender calmamente o significado dessas palavras. - E
isso consiste no que, como chegar nisso?
- Vamos dizer que o terrorismo atual, que
consiste em matar pessoas besta e indiscriminadamente, incluindo a realização
de atentados suicidas, é obsoleto. Pode-se aterrorizar mais. Implantar algumas
bombas e matar dezenas ou poucas centenas de pessoas já não oferece os efeitos
desejáveis e não impressiona mais ninguém. As pessoas do mundo inteiro, e
especialmente em algumas áreas específicas, estão acostumadas. Já não se
impressionam, já não se assustam. Condenam os fatos, gritam, lamentam-se, dizem
que os terroristas são pessoas muito más, que devem ser mortos, mas é só. Depois
de um ato de terrorismo e de derramar algumas lágrimas para os mortos, os
sobreviventes vão tomar um sorvete e retomam rapidamente sua vida normal. Esse
terrorismo já não os aterroriza mais.
- E vocês querem que sintam um imenso terror.
- Exatamente. Mas não só nós. Também o querem
outros grupos como o nosso, mesmo com características diferentes, como o de
grandes industriais, políticos...
- Você está falando demais! - advertiu Annabelle
Simmons.
- Já falei que não lhe servirá de nada. –
rechaçou a Dra. Whitaker. - Além disso, a senhorita Montfort é uma pessoa
inteligente talvez possa nos dar uma boa ideia que levaríamos a Gao Yong e Yong
Gao como se fosse nossa.
- Linda astúcia a sua. – disse Brigitte. – Mas
até agora eu continuo sem saber quem são Yong Gao e Gao Yong.
- Mas já entendeu, né? São os criadores e
diretores do novo terrorismo, o terrorismo... como direi?
- Você já disse antes. – complementou Brigitte. -
O novo terrorismo, o terrorismo artístico, não é? Por favor, diga-me de uma vez
no que consiste o terrorismo artístico.
- Você está interessada, certo?
- Imagina. Em primeiro lugar, porque durante
toda minha vida lutei contra o terrorismo e a maldade em geral. E em segundo
lugar... ou talvez devêssemos dizer em primeiro lugar, porque eu sou uma
jornalista. E eu não consigo imaginar um bom jornalista que não seja curioso.
- Tem razão. Vamos assistir TV um pouquinho...
Dizendo isso, a Dra. Whitaker indicou o elegante
móvel sobre o qual havia um grande televisor de tela plana no qual,
naturalmente Brigitte já havia reparado, mas sem dar muita importância. Susan
Whitaker apontou para a tela com um controle remoto e o acionou.
- É melhor sentar. – recomendou a Dra. Simmons.
Agora sim, Brigitte se sentou no meio do sofá,
de frente para a tela que já estava em funcionamento. Susan Whitaker tinha
agora nas mãos um outro controle remoto, maior e mais complexo que o anterior. Também
o acionou e imediatamente apareceu na tela um lugar que só poderia ser um
laboratório, no qual havia várias pessoas, todas elas usando aventais brancos,
inclinadas sobre bancadas de trabalho onde se viam microscópios, tubos de
ensaio, etc.
- Esta é a seção molecular. –
disse a Dra. Whitaker. - Aqui no C.I.C. temos várias seções e seus respectivos
especialistas e, até agora, temos conseguido algum sucesso, apesar de ainda não
serem tantos nem tão satisfatórios como dignos do nosso esforço e do nosso investimento.
Um centro como este é muito caro de se construir e ainda mais caro de se manter,
e como era de se temer, chegou o momento no qual a parte financeira começou a
ficar desfalcada. Então apareceu o representante enviado por Yong Gao e Gao Yong
que nos fez a proposta.
- Que proposta?
- Fornecer-nos todo o dinheiro necessário em
troca de nos unirmos à equipe mundial de Gao Yong e Yong Gao e, naturalmente,
obedecermos suas instruções, ou seja, nos adaptarmos aos seus planos.
- Parece que tudo gira em torno de Yong Gao e
Gao Yong.
- Claro. Eles são tudo no novo terrorismo. Sem
eles não existiria nosso grupo nem ideia alguma sobre o novo terrorismo. Nenhum
centro ou empresa do grupo saberia o que fazer sem as diretrizes de Gao Yong e Yong
Gao, todas desapareceriam, seja por falta de orientação ou de financiamento. São
eles que promovem, dirigem e financiam o novo terrorismo e, é claro, quem se
servirão de suas diferentes especialidades para usá-las nos seus planos no
momento oportuno. Veja: outra de nossas seções.
Brigitte olhou novamente para a tela. As imagens
foram passando. Era como andar a pé pelos três andares do prédio e pelas
diferentes dependências do C.I.C., uma maneira cômoda de conhecer e de ter uma
boa ideia das atividades dos vários departamentos, setores ou laboratórios centrais.
O passeio virtual durou quase cinco minutos durante os quais Susan Whitaker
dava alguma explicação sobre o que se mostrava. Pela maneira como calou-se ao
aparecer determinadas imagens, Brigitte compreendeu que o passeio havia
terminado, que haviam chegado ao laboratório principal e que a Dra. Whitaker o
havia reservado para o final.
- Esta é a nossa seção. – disse ela. – Quero
dizer, de nós quatro. As pessoas que você vê aí são funcionárias do C.I.C.,
colaboradoras da nossa especialidade.
- E qual é a especialidade de vocês?
As quatro permaneceram olhando para ela. De
repente, Pamela Robinson sorriu e disse:
- Nunca lhe ocorreu que algumas pessoas são tão
importantes ou tão valiosas que é uma pena que exista apenas um exemplar de
cada uma?
Sem demonstrar qualquer reação para a pergunta,
Brigitte olhou alguns segundos para Whitaker, em seguida para a tela onde viu
várias pessoas ocupadas em seu trabalho científico, voltou a olhar para Susan
Whitaker e perguntou:
As quatro cientistas tomaram um susto tão grande
com o questionamento que quase caíram de suas respectivas poltronas. Com
feições pálidas e olhos arregalados, olhavam para “a Montfort” totalmente
incrédulas.
A senhorita Montfort sorriu gentilmente e disse:
- Não se assustem. Acontece que sou muito
perspicaz.
- Como isso aconteceu? – perguntou Pamela
Robinson com voz embasbacada.
- Já disse: sou muito perspicaz e, além disso, o
assunto clonagem nem é novidade. Agora digam: vocês estão pensando em clonar a
mim? É por isso que me trouxeram aqui e estão se divertindo comigo?
Não houve resposta. As quatro mulheres permaneciam
olhando para a senhorita Montfort com olhos arregalados e de bocas abertas.
Brigitte balançou a cabeça num gesto de pesar.
- Há muitos anos um maluco tentou algo similar,
queria fazer um duplicado de mim naturalmente falhou. Afinal, todos sabemos que
obras de arte são únicas. Vocês não concordam?
A Dra. Whitaker finalmente conseguiu reagir. E o
fez colocando-se aos gritos:
- Carson! Carson!
A porta do escritório abriu quase que
imediatamente e Carson apareceu com a arma na mão e olhando para todos os lados
com grande sobressalto.
- O que aconteceu? - ele gritou enquanto Hewitt
e Sparck apareceram atrás dele, também empunhando suas armas.
Susan Whitaker apontou a Brigitte com um dedo
trêmulo e gritou:
- Leve-a daqui e tranque-a num local seguro e
isolado. Logo nos ocuparemos dela e então terá que nos dizer quem lhe deu essa
informação.
- Que informação? – perguntou Carson totalmente
confuso.
As quatro cientistas estavam mais que intrigadas.
Quem poderia haver fornecido essa informação para Brigitte Montfort? Certamente
não poderiam ser Carson e seus dois companheiros, pois eles não sabiam tanto quanto
tinha demonstrado saber “a Montfort”. O que poderia estar acontecendo? Como era
possível que alguns projetos tão secretos, tão sigilosamente desenvolvidos,
eram do conhecimento daquela maldita jornalista? Quem as havia traído?
- Não, não as levem ainda. – mudou de ideia
Whitaker. – Vamos fazê-la contar tudo aqui e agora. Tudo! Segurem-na bem!
Carson deu um sinal e seus companheiros
guardaram suas armas e se aproximaram de Brigitte, que permanecia tranquilamente
sentada, mas com expressão de que assiste a um espetáculo entediante.
E mais uma vez ficou demonstrado que bandidos de
classe baixa nunca aprendem, são incapazes de distinguir a verdade mesmo que
esta esteja queimando suas barbas: Hewitt e Sparck agarraram Brigitte pelos
braços e puxaram-na para colocá-la em pé enquanto Carson se colocava à sua
frente apontando sua arma.
Aquela “anciã” de doce aparência, a pomba
inofensiva, de repente se transformou em uma pantera: seguindo a tração das mãos de Hewitt
e Sparck em seus braços, levantou-se, fez um giro com os dois braços desprendendo-se
assim das mãos dos dois cretinos e, ao mesmo tempo, lançou um surpreendente
pontapé que atingiu Carson nos testículos, quase matando-o. Então, rápido como
um raio, enquanto Carson estava paralisado de dor com o torso dobrado, tomou a
arma de sua mão antes que caísse e saltou para a frente, apontando para Sparck
e Hewitt, que estavam momentaneamente petrificados pelo susto e pela
incredulidade do que viram.
- Permaneçam quietos assim. – sussurrou a divina.
Retrocedeu alguns passos enquanto Carson acabava
de cair de bruços. Naquele exato momento, Sparck deu um grito de raiva enquanto
sua mão direita buscava sua arma.
A senhorita Montfort estendeu o braço, apontou à
sua testa e disparou.
O barulho do tiro soou abafado. Imediatamente a
arma já estava apontanda para Hewitt, que ficou paralisado na sua tentativa de
empunhar sua arma. Brigitte ergueu as sobrancelhas num simpático gesto de
questionamento.
- O quê vai ser? - ela parecia perguntar. - Você
decide.
Lentamente, Hewitt deixou cair os braços.
- Perfeito. - elogiou a espiã mais perigosa do
mundo. - Agora você vire de costas para mim, saque sua arma lentamente, deixe-a
cair no chão e se afaste dez passos dela. Você entendeu direitinho?
Hewitt havia entendido, pois obedeceu todas as
instruções com exatidão. Brigitte recolheu sua arma, bem como a do falecido
Sparck. E já na posse das três armas de fogo sentou-se novamente no sofá. Olhou
calmamente para as quatro apavoradas cientistas e perguntou amavelmente:
- Onde estávamos? Ah, sim, eu tinha que
dizer-lhes tudo. Mas acontece que eu não sei tudo, de modo que vocês é que
farão a gentileza de me dizer.
- Mesmo que dissermos, dará na mesma – disse Pamela
Robinson com voz engasgada. - Porque você não vai sair viva daqui.
- Não? E por que acha isso?
- Há mais homens no Centro, responsáveis pela
vigilância exterior. Se você sair deste escritório ou do Centro, eles a matarão,
pois compreenderão que você escapou de Carson e dos demais. E se você não sair,
eles não tardarão em entrar para checar o que se passa.
- Certo. - Brigitte olhou para seu relógio de
pulso, fez alguns cálculos e propôs: - Mas que tal se, nesse ínterim, vocês me
explicassem melhor sobre essa maravilha de transformar o terrorismo em uma arte?
Não? Vocês são mesmo umas pobres idiotas. De qualquer forma, vamos ver se eu me
faço entender: vocês me dirão tudo o que eu quero saber e farão absolutamente
tudo o que eu mandar. Depois disso, vou oferecer três opções para o seu futuro.
Primeira opção: serão executadas imediatamente e em seguida incineradas de
forma que seus cadáveres nunca sejam encontrados. Segunda opção: serão levadas
a um determinado lugar na África onde serão internadas em um harém ou em um
bordel, ou se preferirem em um puteiro, onde terão a honra de satisfazer os
apetites sexuais de muitos clientes das raças negra, amarela e moura, até que a
morte tenha misericórdia de vocês. Terceira opção: também na África... Um
momento. - sua atitude foi a de tentar escutar algo que devia estar distante. -
Eu acho que eles já estão aqui. Sim, sim, já os ouço perfeitamente.
Fosse o que fosse o que a senhorita Montfort
estava ouvindo, apenas ela o ouvia. As quatro médicas faziam cara de que
estavam surdas. Dos três infelizes que trouxeram Baby ao Centro, um deles naturalmente
não ouvia mais nada pelo menos neste mundo, e os outros dois permaneciam em
silêncio e imóveis. Hewitt estava sentado no chão ao lado de Carson, cujo rosto
era um poema de dor e angústia.
Mas logo começaram a ouvir alguma coisa. Primeiramente,
o som de, pelo menos, dois helicópteros que se aproximaram e, por fim, depois
de um último rugido, não mais se ouviu. Em seguida, o som de tiros, vozes, ruídos
diversos, gritos e alaridos de dor. Passos, ordens...
De repente, a porta do escritório se abriu e
três homens armados com metralhadoras o invadiram ferozmente, apontando para
todos os lados. O que ia à frente e que era visivelmente mais velho e mais alto
que os outros dois, de olhos escuros, rosto enérgico e virilmente atrativo,
olhou para a senhorita Montfort e perguntou:
- Tudo bem?
- Como sempre, meu amor. Você enfrentou problemas
sérios lá fora?
- Não. Eram quatro miseráveis. Nós os
controlamos em menos de dois minutos.
- Ótimo. - Brigitte olhou para as médicas e
disse: - Ele é o Número Um, e está no comando de doze homens da L.O.U. que
chegaram em dois dos nossos mais rápidos helicópteros para emergências. Não
sabem o que é a L.O.U., nem sabem quem é Número Um? Bem, isso não importa muito
considerando as três opções... Ah, sim, a terceira opção, eu esqueci. Bem, a
terceira opção que eu ofereço é a seguinte: serão levadas para a África, mas
não para um prostíbulo ou lugar semelhante, mas para um lugar onde alguém colocará
à sua disposição dinheiro e toda a assistência necessária para que construam e
dirijam, em uma zona bastante ampla, quatro hospitais e centros de abrigo,
alimentação e educação para alguns milhões de negros que – vejam só que coisa
curiosa - são tão filhos de Deus como vocês, e eu diria até mais que vocês. E que
não tentem jamais abandonar aquele lugar ou sair daquela zona, nem de forma
alguma deixar de prestar suas obrigações humanitárias, caso contrário
voltaríamos à segunda opção. Será que eu fui suficientemente clara?
As quatro lindas mulheres passara a língua nos
lábios, e isso foi tudo. Pareciam mais do que mortas, dissecadas em vida. Do
lado de fora ainda se ouvia alguns disparos, passos pesados e gritos, cada vez
com menor frequência. De repente, outro homem armado com metralhadora entrou no
escritório olhando tudo ao redor, imediatamente localizou Brigitte em segurança
e saudou-a com a mão. Em seguida seu rosto se iluminou com um grande sorriso e,
então, olhou para Número Um:
- Tudo controlado, senhor. Não houve feridos.
Nenhum problema.
- Mantenha a posição. Dentro de alguns minutos
vamos registrar tudo e tomar as medidas adequadas.
- Sim, senhor.
Sorriu novamente a Brigitte e esta, depois de
retribuir, dedicou de novo sua atenção para as quatro médicas; mas, em seguida,
olhou para Hewitt e Carson que a olhavam estupefatos, e explicou:
- A drágea para enjôo na verdade era uma cápsula
contendo um transmissor de sinal que é ativado pelo calor do estômago. Se os
sinais desse emissor chegarem de fato ao nosso centro de controle próximo a
Nova Iorque, soa o alarme: estou possivelmente em apuros e então devem localizar-me
o mais rápido possível para me ajudar. Para isso, instalam um localizador de
sinais em um dos helicópteros e alçam voo para encontrar o ponto de onde provém
o sinal e o localizador vai afunilando até encontrar o local exato de onde minha
barriga emite sinais de presença e existência. Obviamente, existem emissores e
receptores para pessoas diferentes e para distintas partes do mundo. Bem, não
importa. Para mim o que me interessa acima de tudo neste momento é o assunto do
terrorismo artístico. – Olhou pausadamente e a sua vez para cada uma das
doutoras. – Não é certo que vocês vão me dizer absolutamente tudo sobre isso e,
em seguida, farão tudo segundo minhas instruções?
Eram Gêmeos Siameses
Ou, como eles mesmos disseram, haviam sido,
porque agora cada um tinha seu próprio corpo. Eles nasceram unidos pelo esterno,
um osso do tórax, mas antes de completarem dois anos, alguns médicos de Bangkok
que haviam estudado nos melhores centros médicos de Tóquio e Nova Iorque e que,
por conseguinte, tinham uma clínica muito famosa em Cingapura, os separou com
sucesso e sem problemas maiores que os esperados em uma operação dessa
magnitude.
Foram chamados de Gao Yong e Yong Gao, um claro sinal
do bom humor paterno, pois não apenas nasceram unidos mas um estava posicionado
do lado oposto do outro, ou seja, um tinha a cabeça do lado onde o outro tinha
os pés. E vice-versa, claro. Por causa disso, seus nomes também estavam
situados em posições opostas. Depois de quase 40 anos, cada um tinha seu corpo
e sua cabeça, caminhava por conta própria e poderia olhar nos olhos do outro em
pé; se bem que, isso sim, em ambas as cabeças fervia o mal com a mesma
intensidade e perfídia.
Haviam idealizado e implementado um plano
conjunto de terrorismo por meio do qual pensavam em submeter o mundo inteiro a
chantagens que partiriam de seus personagens mais significativos e poderosos. E
estes, por sua vez, não teriam sequer a possibilidade de recusa na participação
ou colaboração já que tudo seria feito sem o seu próprio conhecimento.
Imaginemos que durante uma sessão do Senado dos
Estados Unidos da América aparece, de repente, o próprio presidente Bush que
entra, se coloca bem no centro da sala, e ali, quando estiver rodeado pela
maioria dos senadores, comete seu ato de terrorismo suicida, ou seja, provoca a
explosão de uma carga que leva bem dissimulada sob suas roupas. Nem vale a pena
calcular o número de mortos que haveria no Senado com um atentado suicida dessa
envergadura. O importante, nesse caso, é tentar entender como havia sido
possível que o Sr. George W. Bush, presidente dos EUA, aceitou tornar-se um
homem-bomba.
Sessão do Senado Estado-unidense do dia 22 de Setembro de 2012 |
Muito simples: o senhor Bush não era o senhor Bush,
mas um clone do real presidente Bush que, entretanto, ainda não tinha chegado
ao Senado ou sequer teria deixado a Casa Branca para dirigir-se ao Senado. No
entanto, lá estava ele, inesperadamente, entrando sozinho no Senado. E, nesse
caso, em quem passaria a ideia de proibir a entrada do próprio presidente Bush
no Senado enquanto se fizesse averiguações sobre o fato de ter chegado antes do
previsto? Não obstante, ainda haveria uma grande questão: será que o presidente
Bush permitiu ser clonado e ali estava seu clone? Claro que não. Simplesmente, recorreu-se
a uma pessoa parecida com ele no rosto, corpo e porte físico; retocou-se seu
rosto por meio de cirurgia plástica e mandou-a para a morte; pois não só o
rosto seria alterado, mas também o seu cérebro. Ou seja, a realidade é que o
presidente Bush não tinha sido clonado, e sim falsificado.
Claro que isso complicaria muito as coisas e por
isso Gao Yong e Yong Gao haviam idealizado o procedimento mais simples, o
verdadeiro: sequestra-se a pessoa que, de fato, será clonada, retira-a de circulação
e quando o seu clone (um ente de capacidade cerebral nula, na verdade um robô
biológico) estiver preparado, este é enviado para cometer o ato terrorista
suicida. Quando aparecer em público, todo mundo o celebra e o recebe com
entusiasmo. Por exemplo, o ator Richard Gere desaparece subitamente e depois de
certo tempo reaparece, digamos, durante a cerimônia de entrega do Oscar.
85o. Cerimônia de Premiação do Oscar - 24 Fevereiro 2013 - Adele Adkins e Richard Gere |
Será
que alguém se oporia à presença do senhor Gere neste evento tão importante para
a indústria cinematográfica? Claro que não. Pelo contrário, todos os presentes ficarão
muito felizes com sua reaparição, com sua presença, se manifestarão para
cumprimentá-lo, para dar-lhe abraços e beijos; e então o clone do senhor Gere ativa
a carga que envolve seu corpo e...
A essa altura, no entanto, o verdadeiro Richard
Gere há muito foi assassinado e nunca mais foi ou será visto por qualquer ser
humano. Portanto, a história dirá que Richard Gere tornou-se um terrorista
suicida.
Mas vamos ao final do plano diabólico: num
determinado momento se deixa saber que não foi, de fato, Richard Gere o
terrorista, mas sim um clone do famoso e grande ator. A questão, então, surge
em todas as mentes minimamente capacitadas: se as coisas podem ocorrer dessa
forma, como se assegurar que as celebridades são as verdadeiras quando
aparecerem em qualquer evento, seja político, religioso, social ou profissional?
Como saber que são verdadeiros o famoso atleta, o cantor admiradíssimo pelos
jovens que enchem os estádios quando de seus concertos, o político que faz o
discurso principal num comício, o maestro que faz encher um auditório nas
apresentações de sua orquestra, a belíssima atriz que aparece nua no seu último
filme, o festejado professor universitário que escreveu um livro sobre a vida e
a morte?
Como saber que qualquer desses personagens não será
responsável por enviar a outro mundo centenas ou milhares de pessoas que vieram
para torcer pelo atleta, ou para jogar beijos à bela atriz, ou para ouvir
encantadas a música do famoso maestro?
Como será possível viver tranquilo neste novo
mundo onde o terrorismo foi transformado em "arte", onde o clone da
sua mais querida celebridade de repente pode aparecer na sua festa e torná-la num
grande drama?
Como?
Muito simplesmente: de jeito nenhum. Incapaz de
fazer prosperar a paz, o mundo se torna uma jaula de loucos onde a vida sempre estará
por um fio. Ou estará sempre dependente da aparição ou não de um clone
carregado com explosivos. Em qualquer lugar. A qualquer momento.
Falando agora com todas as letras: Gao Yong e
Yong Gao tinham a intenção de foder o mundo inteiro, e isso é o que eles iam
fazer, custasse o que custasse. Por quê se dispuseram a foder o mundo? Porque o
odiavam, odiavam desde que na sua infância começaram a sentir a rejeição e o
desprezo. Todavia, não estavam dispostos a admitir que mereciam rejeição e desprezo,
não por terem sido gêmeos siameses durante dois anos, mas por terem sido
sempre, sempre, sempre, uns grandíssimos filhos da puta que só sabiam fazer o
mal e roubar todo mundo de todas as maneiras, como se não bastasse a imensa
fortuna que seu pai, o contrabandista criminoso que enriqueceu assassinando a
sangue frio e traficando todas as porcarias possíveis e imagináveis do mundo, os
deixou secretamente.
Sentados no terraço localizado no nível do
jardim de sua vasta e pródiga chácara próxima de Bangkok, Gao Yong e Yong Gao meditavam
sobre seus sádicos planos quando apareceu o helicóptero. Os siameses ficaram
olhando para a aeronave que se aproximou da casa e finalmente pousou a uns cem
metros de distância da mesma, entre a piscina e as duas quadras de tênis.
Helicóptero CH 53-Delta Sea Stallion dos Fuzileiros Navais Estado-unidenses |
Do helicóptero desceu um homem muito alto e,
logo em seguida, outros dois que não se afastaram muito da aeronave e ficaram
em posição de descanso, observando ao redor. O primeiro que havia saltado
ajudou uma mulher a sair da aeronave e ela fez um gesto em direção à casa. Ela,
então, se dirigiu sozinha à mesma onde a esperavam os siameses que não deram início
ao menor gesto de cortesia como, por exemplo, levantar e ir ao seu encontro de
maneira afável e hospitaleira. Uma atitude assim não os ocorreria nem em um
milhão de séculos. O que fizeram foi olhar para onde quatro de seus homens assistiam
discretamente a chegada da esperada visita.
Porque Gao Yong e Yong Gao sabiam exatamente
quem era aquela mulher. E também sabiam que ela iria visitá-los naquela manhã, pois
assim havia sido indicado no e-mail criptografado que Susan Whitaker tinha
enviado dos EUA. O que não haviam ainda compreendido muito bem foi a mudança de
planos da Dra. Whitaker e suas colegas. Foram exatamente elas que haviam
proposto a senhorita Brigitte Montfort como o primeiro clone, assegurando que
sua popularidade, prestígio e credibilidade no mundo inteiro a tornava adequada
para qualquer evento. E o evento que havia sido escolhido era que o clone de
Brigitte Montfort visitasse o Empire State Building parecendo que praticaria um
ato bastante popular ao qual certamente assistiriam vários jornalistas de
diferentes jornais, inclusive do próprio “Morning News” que seria o promotor e
coordenador do evento, e câmeras de televisão bem como uma grande quantidade de
público. Daí, no momento em que poderia fazer mais dano, a senhorita Montfort se
tornaria na primeira grande terrorista suicida que faria do terrorismo uma
arte, causando a morte de centenas de pessoas e o colapso do edifício mais
famoso do mundo.
Este foi o plano inicialmente proposto pela Dra.
Whitaker e suas três belas colegas, e que tinha merecido a aprovação dos
irmãos, filhos do mal. E, de repente, a eles chega um e-mail informando que o
plano havia sido consideravelmente melhorado com a inesperada ajuda da muito
inteligente senhorita Montfort e que esta, muito interessada em se juntar ao
grupo, os visitaria para pessoalmente explicar todos os detalhes.
E ali estava ela, a apenas cinco passos de
distância.
Com altura um pouco acima da média, corpo esplêndido,
elegante, belíssima, com olhos mais azuis que o firmamento que os mantinha fixos
neles, olhando para um e outro como se fossem seres de outro mundo.
- Francamente... - disse de cara Gao Yong sem preâmbulos
ou qualquer protocolo – esperamos que realmente seu novo plano seja melhor do
que o nosso anterior, embora eu pessoalmente duvide.
- Eu não. – disse a pantera.
FIM
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